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Os 70 anos da CLT – o legado e o futuro[1]” (Artigo de José Pastore – Universidade de São Paulo)

30 de abril de 2013
Os 70 anos da CLT – o legado e o futuro[1]” (Artigo de José Pastore – Universidade de São Paulo)

A discussão sobre as mudanças na CLT tem gerado mais calor do que luz. O tema é apaixonante. Os Brasileiros se sentem inseguros quando vislumbram alterações nas proteções garantidas por lei.

A Consolidação das Leis do Trabalho constituiu um avanço significativo no campo da proteção social. Até 1943 o Brasil dispunha apenas de leis esparsas sobre o trabalho de menores e das mulheres, férias, organização sindical e alguns outros (poucos) direitos, mal definidos e pouco abrangentes.

A CLT sistematizou o que existia, e acrescentou no quadro jurídico do país importantes proteções individuais e coletivas para regular as relações do trabalho entre empregadores e empregados. Após a sua promulgação, várias leis foram sendo elaboradas para garantir direitos adicionais como o repouso semanal, o 13º. salário, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviços e outros.

Com a Constituição Federal de 1988, os direitos foram ainda mais ampliados tais como a definição do valor das horas extras, do abono de férias, da estabilidade temporária da gestante, da licença paternidade e vários outros.

Fontes das regras do trabalho

O processo de elaboração de leis do trabalho no Brasil sempre seguiu o princípio segundo o qual os direitos têm de ser explicitados nos mínimos detalhes para que as proteções sejam garantidas de forma homogênea a toda força de trabalho. É o princípio estatutário.

Esse princípio se funda na crença da força da lei para regular as relações do trabalho. É bem diferente do princípio negocialsegundo o qual a especificação de detalhes se funda na força dos contratos, livremente negociados, e sob o argumento de que eles têm maior capacidade para garantir proteções em condições heterogêneas como ocorre no mercado de trabalho onde as características e as necessidades dos trabalhadores variam por setor, por região, por empresa, por tipo de contratação e várias outras. O princípio negocial reflete a manifestação livre das partes enquanto que o princípio estatutário reflete a vontade dos legisladores.

Os países que optaram pelo modelo estatutário possuem uma grande quantidade de leis e um amplo sistema jurídico para tratar dos desvios. Essas leis convivem ao lado de poucas regras estabelecidas nos contratos de trabalho negociados.

Os países que optaram pelo modelo negocial, ao contrário, possuem poucas leis gerais e uma grande quantidade de regras detalhadas que são embutidas nos contratos de trabalho negociados entre as partes. Em muitas categorias profissionais dos Estados Unidos – que se baseia no sistema negocial – o contrato coletivo de trabalho é do tamanho da nossa CLT enquanto que as leis gerais se resumem a poucas páginas.

O mesmo ocorre no Japão. Os japoneses dizem que de nada adianta colocar os detalhes nas leis porque as realidades do mundo do trabalho são muito diferentes, e difíceis de serem enquadradas no mesmo figurino. Por isso, colocam nas leis apenas os princípios gerais que se aplicam a todos os atores do trabalho, deixando para os contratos coletivos o estabelecimento dos detalhes para cada situação particular – até mesmo no nível das empresas.

As raízes das regras brasileiras

Quais são as raízes do nosso modelo estatutário? Muitos atribuem ao sistema italiano e, em parte, ao francês. Por trás disso, porém, está a nossa tradição cultural. Vivendo em regime de extrema desigualdade, que durante muito tempo foi marcado por uma sociedade dividida entre a nobreza (fidalgos, militares e sacerdotes) e a plebe (o povo), desde os tempos da colônia, os brasileiros foram levados a acreditar no Estado como única força para garantir proteção.

Na área trabalhista, os brasileiros nunca acreditaram firmemente em proteções garantidas por negociação e contratos. É interessante notar que na área cível, respeita-se o que é negociado e o que é estipulado nos contratos para comprar um imóvel ou um automóvel. Na área trabalhista, os brasileiros apreenderam a desejar apenas as garantias definidas por lei. As garantias alcançadas por negociação e estabelecidas no contrato lhes dão sensação de segurança.

Fontes de resistência à mudança

Sabendo disso, os parlamentares não se arriscam a mudar nada na legislação, pois não querem contrariar os eleitores e, com isso, perder votos. Por isso, quando discutem novos projetos de leis, têm sempre em mente criar novas proteções legais – sem considerar os impactos e os desdobramentos dessa proteções. Muitas delas, criadas com a melhor das intenções, voltam-se contra os trabalhadores.

No meu entender, é essa base cultural que explica a enorme resistência para se mudar as leis do trabalho no Brasil. No mundo jurídico, os cursos de direito do trabalho levaram adiante e sofisticaram a filosofia do garantismo legal que se baseia no já citado princípio estatutário. Para a maioria dos magistrados, a única proteção que lhes desperta confiança é a garantida por lei ou por jurisprudência.

A exacerbação de direitos em textos legais chegou até a Constituição de 1988. Na Carta Magna, a palavra direito é usada 76 vezes enquanto que a palavra dever aparece apenas quatro vezes. A palavra produtividade ocorre duas vezes e eficiência apenas uma vez.  Na CLT, onde há quase mil artigos, temos um verdadeiro festival de direitos sem a mínima correspondência com as obrigações e os deveres.

A tradição continúa presente

O Brasil patrocina o modelo estatutário até os dias de hoje, insistindo em aplicar um conjunto complexo de leis e de atos administrativos e jurisprudenciais às diferentes realidades do mercado de trabalho. Está aí a insistência no princípio dahipossuficiência. Profissionais altamente qualificados, de renda alta, que cuidam de suas próprias proteções nos campos da saúde e da previdência social, estão legalmente impedidos de estabelecer com seus contratantes as regras de seu trabalho se estas ficarem fora da tutela da CLT, do Ministério e da Justiça do Trabalho.

O mesmo ocorre com as pessoas que desejam trabalhar em regimes diferentes das jornadas estabelecidas em lei. Igualmente impedidos estão os profissionais que desejam ser remunerados – sistemática e habitualmente – por aquilo que produzem, e não pelas horas que trabalham.

Essa legislação contempla ainda uma profusão de regras rígidas para as chamadas profissões regulamentadas. Os bancários e os ascensoristas têm uma jornada de trabalho de seis horas por dia. Os jornalistas e radialistas têm cinco. Os médicos e os advogados têm quatro.

São inúmeras as profissões que têm jornadas especiais baseadas em um conjunto de detalhes que fixam não apenas o tempo de trabalho como também as regras para os intervalos e os pisos salariais – tudo definido em leis, atos administrativos ou expedientes jurisprudenciais. Os detalhes são imensos e, muitas vezes, discriminam este ou aquele grupo. Por exemplo, está aí a lei exige que a mulher – mas não o homem –, um descanso de quinze minutos antes de iniciar uma hora extra quando, na prática, carece de justificação nos dois casos.

A rigidez do quadro atual

Numa palavra, a rigidez do nosso quadro jurídico permite negociar apenas dois direitos: o salário e a participação nos lucros e resultados. Essa rigidez pretende conviver com empreendimentos derivados de novas tecnologias que vêm transformando radicalmente os modos de trabalhar, e propondo variadas formas de contratação.

A economia concorrencial é bem diferente da economia monopolista. Nela, o verdadeiro proprietário dos postos de trabalho é o consumidor. Se ele não for atendido com preço, qualidade e pontualidade, as empresas fecham suas portas e os trabalhadores perdem seus empregos, até mesmo os que são tutelados pela lei e pela jurisprudência.

Isso significa dizer que as empresas modernas não têm outra saída senão serem muito eficientes no atendimento das necessidades e aspirações dos consumidores. E, para tal, precisam contar colaboradores qualificados, satisfeitos e atendidos nas suas aspirações individuais como, por exemplo, a de trabalhar com a liberdade que melhor se adapte às suas peculiaridades.

Novas formas de trabalhar

É claro que a grande maioria dos trabalhadores do mundo ainda opera na base do vínculo empregatício do trabalho regular. Mas, ao lado deles cresce o número dos que trabalham de modo peculiar e que não se ajusta às regras da homogeneidade da situação de emprego que marcou a sociedade industrial da primeira metade do século passado, mas que não mais se aplica à atual sociedade do conhecimento baseada fundamentalmente em serviços diversificados.

Mesmo entre os que trabalham com vínculo empregatício em um mesmo setor, há diferenças que já deveriam ter sido contempladas por leis atualizadas. O próprio conceito de empregado passa por ampla revisão. De acordo com a definição tradicional, considera-se como empregado o trabalhador que trabalha para outra pessoa, recebendo ordens, com base em um contrato privado no qual se estabelece a relação de subordinação.

Nos dias de hoje, entretanto, aumenta cada vez mais o numero de profissionais especializados que gozam de liberdade na execução de suas atividades, como ocorre, por exemplo, com pesquisadores, artistas, jornalistas, profissionais da tecnologia da informação, consultores e até com engenheiros, advogados e médicos que trabalham dentro de organizações definidas. Para esses casos, o conceito tradicional de subordinação jurídica perdeu atualidade e o sentido.

Essa é a razão que levou muitos países avançados a tratar esses profissionais como “contratados independentes”. Seus contratos estão atrelados às regras do código civil e não às leis trabalhistas. Estamos longe disso no Brasil. Entre nós, tudo tem de ser regulado pelas regras do vínculo empregatício que ignora as variações das relações do trabalho de profissões e ambientes diferenciados.

Ambiente de negócios e relações do trabalho

A insistência de querer aplicar regras rígidas e homogêneas em situações voláteis e heterogêneas conspira contra a eficiência dos negócios, a felicidade e a qualidade de vida dos trabalhadores. Ademais, essa insistência gera uma enorme insegurança jurídica. No Brasil, a insegurança é agravada por uma prática sui generis que se refere à aprovação de leis que têm efeito retroativo e, com isso, gravam e tributam o passado.

É o caso da nova lei do aviso prévio. Outro exemplo é a lei que elevou a alíquota do FGTS para cobrir um alegado déficit do passado – e que até hoje continua viva, apesar do referido déficit ter sido coberto há muito tempo.

No Brasil, há ainda uma profusão de leis obscuras que demandam da Justiça do Trabalho a sua interpretação, geralmente realizada por meio de um grande numero de expedientes que, no conjunto, formam de fato uma verdadeira Consolidação da Jurisprudência do Trabalho – tão ou mais complexa do que a própria Consolidação das Leis do Trabalho. Poucas são as empresas e os trabalhadores que conhecem, entendem e dominam o cipoal de regras que preside a contratação do trabalho no Brasil.

O papel da subjetividade

A insegurança cresce quando, em lugar de seguir os mandamentos objetivos, a Justiça do Trabalho passa a decidir com base em princípios subjetivos cujo resultado não pode ser antecipado por ninguém. É o que ocorre quando os magistrados anulam acordos coletivos livremente negociados entre as partes invocando que os mesmos se afastaram do principio da dignidade humana ou dasaúde física e mental das pessoas.

É o que tem acontecido, por exemplo, com os acordos coletivos firmados entre as partes para reduzir o horário de almoço, em troca da antecipação do término da jornada de trabalho – assunto que será tratado neste Seminário.

A imprevisibilidade que decorre desse tipo de decisão desorienta os administradores e inibe os investidores. No meu entender, esse é o maior sinal de atraso do nosso quadro trabalhista. Em nenhum país moderno, o Poder Judiciário interfere com decisões objetivas e subjetivas naquilo que foi livre e ordeiramente negociado entre partes legítimas. Hoje, até mesmo os trabalhadores demandam autonomia e respeito àquilo que negociam com os empregadores. Esse é o espírito do Acordo Coletivo Especifico proposto pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

O custo da insegurança

A imprevisibilidade nas decisões judiciais gera um alto custo de transação e um incontrolável estado de incerteza o que, por sua vez, dificulta o planejamento e a execução de projetos em um ambiente competitivo. Costuma-se dizer que nenhuma empresa que opera no Brasil sabe exatamente qual é o seu passivo trabalhista, mesmo porque, a cada instante, e em meio de sobressaltos e turbulências, ela se vê diante de situações jamais antecipadas quando analisadas à luz do bom senso.

No campo da jurisprudência, o país tem assistido a um verdadeiro festival de exageros em matéria de rigidez. Não se discute aqui o propósito humanitário das decisões judiciais. Ocorre que, em muitos casos, a desconsideração dos desdobramentos econômicos e sociais simplesmente anula o defensável propósito humanitário. Devo dar dois exemplos que mostram como uma medida de caráter social se transforma em ato de perversidade para os trabalhadores.

A Súmula do TST de número 366 diz: “Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de 5 minutos, observado o limite máximo de 10 minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal”.

Em decorrência disso, muitas empresas passaram a exigir a saída imediata dos empregados após o horário de expediente, impedindo a prática comum e salutar dos que ali permaneciam por uma ou duas horas para estudar e se preparar para as aulas noturnas da faculdade que freqüentam.

Outro exemplo. Ao querer proteger as empregadas domésticas com a PEC 66/2012, os legisladores trataram o ambiente dos domicílios como se fosse um ambiente de empresa, equiparando as domésticas às operárias, bancárias e enfermeiras. As diferenças são gritantes. As empregadas que moram na casa dos empregadores, não pagam aluguel, água, eletricidade, alimentação e nem os impostos respectivos.

Para as que não moram no emprego, o usufruto desses benefícios é o mesmo, com exceção da moradia. Nada disso ocorre com as operárias, as bancárias e as enfermeiras. No trabalho empresarial o ponto é supervisionado, o horário de entrada e saída é rigoroso, as paradas para alimentação são fixas e nem se pensa na possibilidade de assistir televisão durante a jornada.

Os cuidadores de doentes e idosos assim como as babás têm demandas intermitentes ao longo da jornada, bem diferentes do que ocorre na linha de montagem das fábricas, no atendimento dos clientes nos bancos ou na administração de medicamentos nos hospitais.

Na aprovação dessas regras, os parlamentares deixaram de lado o principio constitucional da isonomia que manda tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente. Criou-se, com isso, uma colossal insegurança jurídica que está levando muitas famílias a demitir uma empregada mensalista com registro em carteira para contratar uma ou duas diaristas sem nenhuma proteção. A primeira entra no mundo dos desempregados e as diaristas engrossam as fileiras dos trabalhadores informais – um efeito bem diferente do que o autor do projeto de emenda constitucional pretendeu com a aprovação daquela medida.

A atualidade das irracionalidades

Esse tipo de enrijecimento e, porque não dizer, de irracionalidade não tem 70 anos. Ele é um produto contemporâneo, aprovado em abril de 2013, em pleno século 21, quando o mais imprescindível é criar-se ambientes seguros e favoráveis para os negócios e para os trabalhadores. Isso mostra que a cultura do garantismo legal nos persegue até hoje apesar da sua desatualização e disfuncionalidade no mundo moderno.

Toda essa rigidez seria justificável se de fato conseguisse, de fato levar a proteção à toda força de trabalho. Apesar dos grandes avanços da formalização nos últimos anos, o grupo dos que não contam com as proteções da CLT chegam a 52 milhões de brasileiros em uma força de trabalho de cerca de 100 milhões de trabalhadores[2].

O que a rigidez e o detalhismo têm conseguido é promover uma explosão de conflitos individuais, provocando desgastes psicossociais e enormes despesas para a nação. Em 2010, a Justiça do Trabalho gastou R$ 11,8 bilhões para julgar cerca de R$ 11,2 bilhões (valores pagos aos reclamantes)[3] o que significa dizer que para julgar um real gastou-se mais de um real, sem contar as despesas das partes e da sociedade em geral. Trata-se de uma taxa de retorno aquém do razoável para o Contribuinte.

A continuar com essa trajetória de rigidez e insegurança teremos sérios problemas para enfrentar a competição global que é crescente e um eventual desaquecimento da economia que não deve ser descartado. Abro aqui um parêntesis para lembrar o que está ocorrendo em vários países da Europa.

Na Espanha, por exemplo, aonde o desemprego ultrapassou a espantosa cifra de 27% em março de 2013, os empresários estão com medo de reempregar porque sabem que não conseguirão despedir os empregados no caso de dificuldade devido à rigidez da Convenção 158 da OIT, ratificada por aquele país em 1985.

Com isso o desemprego se arrasta e se torna uma doença de longa duração, causando graves danos sociais e arrasando as finanças públicas que têm de arcar com as pesadas despesas do seguro desemprego e da assistência social.

Apesar desse escandaloso exemplo de regra perversa, muitos sonham em querer travar as dispensas do emprego por força de lei no Brasil, esperando que, com isso, o país ampliará as oportunidades de emprego e reduzirá a rotatividade – o que nunca foi comprovado empiricamente. Outros querem a redução de jornada de trabalho com o intuito de criar novos postos de trabalho – o que igualmente carece de referências históricas.

Há ainda os que insistem em impedir a terceirização que tem provado ser geradora de emprego e de melhoria de renda e redutora dos preços dos bens e serviços para os consumidores.

Como mudar?

Ao chegar neste ponto, sou levado a perguntar: Qual é o tempo mais adequado para se mudar a CLT? No Brasil, a constatação tem sido nunca! Essa é a resposta mais freqüente. Quando o emprego é abundante e a massa salarial cresce, como na situação atual, as pessoas não vêem justificativa para mudar nada. É a filosofia do “não se mexe em time que está ganhando”. Quando o país mergulha na recessão, todos resistem à mudança sob o argumento de que não se pode afrouxar as proteções na hora de desemprego ascendente. Ou seja, nunca é tempo para se mudar as regras rígidas.

O que está por trás dessas posições, é a petrificada tradição cultural que leva os brasileiros a achar que tudo se resolve e pode ser melhorado editando-se uma nova lei. Nos países avançados, as mudanças têm ocorrido tanto em momentos de franca atividade como nos momentos de recessão. No primeiro caso, as mudanças são introduzidas hoje para entrarem em vigor em anos futuros – o que facilita a superação das resistências –, como fizeram vários países com a elevação da idade de aposentar. No segundo caso, as mudanças são dolorosas por que têm de entrar em vigor imediatamente, como ocorre com as nações do sul da Europa nos dias atuais.

O Brasil está perdendo a oportunidade de usar o bom momento dos tempos presentes. O que falta entre nós é uma firme liderança e uma pedagogia eficiente por parte de governantes que deveriam pensar nas próximas gerações e não apenas nas próximas eleições. Estamos em momento de crescimento de emprego, é verdade. Mas o ritmo perde fôlego. O setor industrial já não consegue competir. Nele, o crescimento do emprego é cadente. O Brasil está cercado de incertezas quanto a sustentação do crescimento econômico.

Nos dias que correm pergunta-se porque os produtores não se animam a investir se os juros baixaram, o crédito se expandiu, os incentivos aumentaram, as desonerações entraram em cena e tantos outros estímulos foram oferecidos para a sua decisão? Tudo indica que o excesso de intervencionismo governamental assustou os investidores. No meu entender, a insegurança jurídica é a maior trava aos investimentos e ao crescimento econômico no momento atual. Ninguém investe quando duvida dos marcos regulatórios. E, no campo trabalhista, esse problema é crônico e continua grave pelos motivos até aqui arrolados.

A comemoração dos 70 anos da CLT é uma oportunidade para se refletir sobre o que pretendemos fazer daqui para frente. A economia deverá continuar crescentemente competitiva. As tecnologias continuarão induzindo novas formas de trabalhar. A divisão do trabalho crescerá de modo acelerado tanto pela necessidade de subcontratar entre países como de subcontratar e terceirizar dentro do próprio Brasil. Para enfrentar esses desafios, o país precisa criar um ambiente favorável para que todas as novas formas de trabalhar possam ser praticadas com segurança, observando-se as proteções necessárias aos que trabalham.

Mas, os meus mais de 70 anos de vida me ensinaram a ser realista. Na minha juventude, eu julgava ser possível fazer-se uma transformação radical do quadro jurídico trabalhista do Brasil, ampliando-se vigorosamente o espaço da negociação para as partes acertarem suas diferenças com liberdade. Quando se aprovou a Constituição de 1988, vi ali uma maneira simples de se chegar a essa façanha: bastava introduzir no início do caput do artigo 7º. a expressão, “salvo negociação”.

O tempo me ensinou que a singeleza desse “salvo negociação” batia de frente com o atavismo e a pesada tradição cultural dos brasileiros que só acreditam em proteções garantidas por lei – apesar da realidade mostrar a cada dia a sua impotência para proteger a maioria dos que trabalham.

Hoje em dia, com milhares de quilômetros rodados…, estou convencido de que a reforma da CLT só poderá ocorrer de forma fatiada e gradual. Por isso, vejo com muita esperança o documento da Confederação Nacional da Indústria (101 Propostas para Modernização Trabalhista, Brasília: CNI, 2012) que apresenta um conjunto de sugestões a serem debatidas e implementadas gradualmente, e com a participação das partes envolvidas.

Essa modernização, ainda que gradual, será crucial para preparar o Brasil para os próximos desafios.  O assunto será tratado aqui. Por isso, acredito que este Seminário será inserido na história como um decisivo primeiro passo da longa cruzada a ser empreendida para a atualização da nossa CLT. Muito obrigado.

[1] Pronunciamento realizado na abertura do Seminário sobre “Os 70 anos da CLT”, realizado pela Fecomercio de São Paulo em parceria com a CNI em 26/04/2013.

[2] Segundo os dados da PNAD de 2011, dos 100 milhões de trabalhadores que compunham a força de trabalho naquele ano, 19,7 milhões trabalhavam por conta própria; 14 milhões eram “outros e sem declaração”; os desocupados somavam 6,7 milhões; os empregados domésticos sem registro eram 4,6 milhões; os que trabalhavam na produção para próprio consumo e na construção para uso próprio, chegavam a 3,75 milhões e os não remunerados a 3,2 milhões.

[3] Dados do Orçamento Geral da União e da Consolidação Estatística da Justiça do Trabalho publicada no Relatório Analítico referente a 2010.

Fonte: CNI / Blog RT

 
 


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