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Gestão: Segurança e Saúde no Trabalho – 18

28 de março de 2023
Informativo
A violência e o assédio no trabalho

Publicado em 27 de março de 2023

Por Vinícius Pinheiro

Práticas são inaceitáveis moralmente e ameaçam a igualdade de oportunidades profissionais.

A maioria de nós conhece, ao menos, um caso de alguém que sofreu assédio ou violência no trabalho. Longe de ser um episódio isolado, trata-se de um fenômeno generalizado em todo mundo, cuja perpetuação encontra aliados no silêncio e na inação.

Uma pesquisa global realizada pela OIT, em parceria com a fundação Lloyd’s Register e o Instituto Gallup, revelou que uma em cada cinco pessoas empregadas já sofreu algum tipo de violência ou assédio – seja físico, psicológico ou sexual – no ambiente de trabalho, em algum momento de sua vida profissional. Isso significa 743 milhões de homens e mulheres em todo o mundo.

A ratificação da Convenção 190 pode tornar visível o dissimulado e para a construção de culturas corporativas e laborais de inadmissibilidade da violência e do assédio em suas várias formas, assim como seus danos físicos, psicológicos, sexuais e econômicos

A violência e o assédio no trabalho são recorrentes e persistentes: mais de três em cada cinco vítimas disseram ter passado por essas violações múltiplas vezes, e, para a maioria, o mais recente incidente ocorreu nos últimos cinco anos.

Nesse cenário, falar sobre experiências pessoais de violência e assédio ainda é um desafio. Segundo a pesquisa, pouco mais da metade (54,4%) das vítimas compartilharam sua experiência com alguém. Elas se mostraram mais propensas a contar a amigos ou parentes, do que a utilizar canais informais ou formais de denúncia.

Mais do que reconhecer a magnitude e a frequência dessas violações de direitos é preciso entender as principais barreiras que impedem as pessoas de denunciá-las e as razões para essa prática ainda ser tão frequente. Uma delas é o medo de represálias ou da denúncia não ser considerada.

Muitas pessoas temem que o perpetrante não seja punido ou que haja um risco para sua reputação e esses receios são os motivos mais comuns que desencorajaram as denúncias.

No Brasil, a situação não é diferente. A mais recente edição da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do IBGE estima que, em 2019, 27,6 milhões de pessoas de 18 anos ou mais sofreram violência psicológica nos 12 meses anteriores à entrevista, ou seja, 17,4% da população.

Desse total, 5 milhões de pessoas informaram ter sofrido violência psicológica no ambiente de trabalho, o correspondente a 18,4% das respostas gerais.

De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho, em 2022, foram registrados, na Justiça do Trabalho, 77,5 mil novos processos por assédio moral e 4,5 mil processos por assédio sexual.

A violência e o assédio são inaceitáveis moralmente e ameaçam a igualdade de oportunidades profissionais. São atitudes incompatíveis com o trabalho decente e têm impacto direto nas relações no ambiente de trabalho, na reputação das empresas e na produtividade do trabalho.

Certamente existe uma dinâmica de gênero relacionada à violência e ao assédio, gerando um impacto desproporcional sobre as mulheres e outros grupos que já sofrem discriminação como a população LGBTQIA+ e pessoas com deficiência. Esta realidade contribui para a diferença que vemos hoje entre as condições e oportunidades de trabalho para homens e mulheres.

Entre as medidas anunciadas pelo governo no Dia Internacional das Mulheres está o envio ao Congresso de mensagem de ratificação da Convenção 190 da OIT sobre violência e assédio no trabalho.

A ratificação deste tratado internacional pelo Brasil poderá se traduzir em ambientes laborais mais dignos, saudáveis e produtivos, com maior participação da mulher no mercado de trabalho.

A ratificação da Convenção 190 pode contribuir para tornar visível o dissimulado e para a construção de culturas corporativas e laborais de inadmissibilidade da violência e do assédio em suas várias formas, assim como seus danos físicos, psicológicos, sexuais e econômicos.

Este tratado internacional da OIT define pela primeira vez o conceito de violência e assédio no mundo do trabalho e, dentre outros temas, indica quais medidas devem ser tomadas para prevenir e lidar com essas violações.

A Convenção 190 já foi ratificada por 25 países, aplica-se aos setores público e privado, incluindo a economia informal, e engloba todas as pessoas do mundo do trabalho, independentemente da sua situação contratual.

Ela define o escopo das possíveis vítimas, que podem incluir pessoas empregadas, terceirizadas ou autônomas, clientes e provedores, trabalhadoras domésticas, pessoas em treinamento, estágio ou trabalho voluntário, e mesmo aquelas que estejam participando de entrevistas, procurando emprego ou que tenham se desligado da empresa.

Reconhecendo que a violência não ocorre de maneira homogênea, a Convenção identifica setores e ocupações específicas que merecem atenção redobrada, como saúde, educação, hospitalidade, serviços sociais, transporte, artes e entretenimento e trabalho doméstico.

Ela está calcada em uma abordagem inclusiva e integrada para prevenir e eliminar a violência e o assédio, por meio do diálogo social com representantes de trabalhadores e de empregadores. Esta abordagem permite a elaboração de medidas eficazes de prevenção e proteção, fiscalização e restituição, orientação, treinamento e sensibilização sobre o tema.

A Convenção também desafia a relegação da violência doméstica como um tema exclusivo da esfera privada. Ao reconhecer a gravidade desta violação e seus efeitos colaterais negativos para o mundo do trabalho, especialmente em relação à saúde e segurança, a Convenção salienta a contribuição positiva que governos, organizações de empregadores e de trabalhadores podem ter para interromper o ciclo de violência.

Ela sugere que governos devem adotar leis e regulamentos determinando a obrigatoriedade de adoção de políticas de tolerância zero para a violência e assédio no âmbito das empresas; assim como de canais de comunicação, denúncia e investigação, incluindo proteção às vítimas.

O Brasil tem diante de si a oportunidade histórica de ratificar a Convenção 190 da OIT e, assim, adotar uma medida concreta rumo à construção de um mundo do trabalho mais seguro e produtivo, com igualdade de gênero e justiça social.
Fonte: Valor Econômico

 

Servidores do Ministério Público relatam assédio sistemático de chefes, mostra pesquisa

Publicado em 27 de março de 2023

Levantamento com 4.077 funcionários aponta que metade afirmou ter sofrido assédio moral; CNMP diz que estudo embasará criação de política de saúde mental.

Em abril completa um ano e seis meses que os servidores do Ministério Público em níveis federal e estaduais reivindicam a criação de um programa de saúde mental junto ao CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

A proposta foi protocolada no conselho em 2021 junto com a apresentação de uma pesquisa encomendada pela Comissão de Saúde da própria instituição, que buscou analisar os riscos psicossociais no Ministério Público brasileiro. As respostas relacionadas à violência psicológica e ao assédio no ambiente de trabalho surpreenderam, pois indicaram recorrentes hostilidades da parte de superiores hierárquicos.

Foram citados subprocuradores, procuradores e seus assessores, tanto comissionados quanto em cargos efetivos.

O Ministério Público, nas diferentes esferas, tem entre suas funções zelar pelos interesses sociais e individuais. O conselho da instituição é composto, em sua maioria, por procuradores, além de advogados e representantes da magistratura e do Congresso.

“A gente vinha percebendo o adoecimento dos colegas, tanto por sobrecarga de tarefas quanto por causa dos assédios no ambiente de trabalho, mas todo mundo tem medo de falar por causa do risco de represália, e a gente ficava limitado”, diz Erica Oliveira, que trabalha na Fenamp (Federação Nacional dos Servidores dos Ministérios Públicos Estaduais).

“O levantamento trouxe estatística para demonstrar a urgência em relação à questão e nos deu os dados para que pudesse fazer reivindicações”, prossegue.

Intitulada “Atenção à Saúde Mental de Membros e Servidores do Ministério Público: fatores psicossociais no trabalho no contexto da pandemia de Covid-19”, a pesquisa foi concluída em outubro de 2021, quando a maioria estava em home office.

Para os pesquisadores, ela mede o ambiente laboral como um todo, e as respostas podem ter sido mais francas por causa do distanciamento físico da repartição pública.

A pesquisa, realizada pela Ufrgs (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e sua fundação, a Faurrgs, ouviu 4.077 integrantes do Ministério Público em 26 estados e do Distrito Federal, entre membros e servidores efetivos e em cargos de comissão.

No estudo, 77,2% dos entrevistados afirmaram ter sofrido algum tipo de constrangimento emocional, sendo que 50,1% se declararam vítimas de assédio moral e outros 27,1% disseram que foram alvo de violência psicológica.

Do total de participantes 6,7% afirmaram já terem pensado em acabar com a própria vida.

Do total, 85% apresentaram um risco aumentado de adoecimento psicológico. Quando perguntado se havia iniciado algum tratamento de saúde mental após o ingresso na instituição, 42,4% responderam que sim, sendo que 16,5% afirmaram ter recorrido a um psicológico, 6%, um psiquiatra, e 19,9%, a ambos.

O estudo concluiu que os problemas eram ignorados. Prevalecia a percepção entre os servidores que a melhor alternativa para manter o bom ambiente no trabalho era ficar calado. Tristeza, revolta, impotência, medo e frustração são alguns dos sentimentos listados por quem foi alvo ou testemunha de uma agressão psicológica.

A pesquisa transcreve declarações anônimas de assédio, tanto moral como sexual (leia alguns trechos abaixo). A reportagem também ouviu servidores que denunciaram hostilidades na condição de não terem os nomes divulgados.

Houve relatos de importunação, como o chefe dizer constantemente a uma servidora as vantagens de sair com ele. Humilhação, como ser obrigado a catar papel no chão ou ser repreendido na frente de colegas por não atender rapidamente uma demanda.

O assediador pune quando é denunciado. Costuma processar o autor da denúncia, tanto na esfera administrativa quanto na Justiça, inclusive criminalmente. Mesmo que perca todos os pleitos, o acusado de assédio continua abrindo processos, inviabilizando a vida profissional de quem fez a denuncia.

HIERARQUIA RÍGIDA ABRE ESPAÇO PARA ASSÉDIO

De acordo com a psicóloga Silvia Generali da Costa, que participou da pesquisa, as denúncias de assédio têm crescido nas instituições públicas com estruturas mais rígidas.

“O mais preocupante nos resultados no Ministério Público são os índices de adoecimento, a ideação suicida e o grau de esgotamento mental dos participantes da pesquisa”, afirma ela.

“No entanto, tenho pesquisado instituições públicas, como Judiciário e órgãos que trabalham com socialização de jovens e adultos, e o problema do assédio moral tem sido recorrente.”

Segundo Costa, que também é assessora na ouvidoria do Sindicato dos Servidores do Ministério Público no Rio Grande do Sul, a estrutura do setor público brasileiro está organizada de forma hierárquica, centralizada, com problemas de comunicação e de valorização do servidor. Nos últimos anos, o ambiente se tornou mais tenso.

As repartições públicas foram incentivadas a importar métricas do setor privado, cobrando metas e resultados, sem, no entanto, oferecerem a contrapartida de reforço da infraestrutura que dispõem empresas privadas, pressionando gestores a elevar a cobrança sobre os servidores. Essa pressão, explica a psicóloga, muitas vezes se manifesta na forma de assédio.

“Então, o assédio moral não é ato de um ou dois psicopatas que, por algum descuido do processo seletivo, entraram para o setor público. Não é isso”, afirma ela.

“O assédio é institucional, quase uma ferramenta de trabalho. Isso se agrava em instituições como o Ministério Público, cuja estrutura é uma pirâmide, com um grupo pequeno no comando, que tem diferenças de status, poder e recompensas. Falta treinamento para gestão também. Um promotor faz concurso para trabalhar com direito, não para gerir pessoas.”

A psicóloga reforça que evidências de vulnerabilidade não deixam dúvida de que o MP precisa implantar mecanismos para aprimorar a gestão de pessoal e também para monitorar e sanar os efeitos psicológicos apontados na pesquisa.

“É necessário reavaliar questões como capacitação de gestores, número de servidores e modernização da infraestrutura de TI, por exemplo, que podem melhorar os processo de trabalho”, afirma

“Mas também é preciso uma política de saúde mental e de apoio em caso de violência, com um canal, um comitê, um espaço onde o servidor possa fazer uma denúncia, e que ela seja investigada de forma isenta, pelo aspecto do grupo de trabalho, porque um dos maiores problemas do combate ao assédio é que ele é individualizado.”

Depois do rito de contribuições e de ficar um tempo na mesa do relator ao longo de 2022, a proposta para a criação do programa de saúde mental voltou, no início de março deste ano, para a Comissão de Saúde para que fossem feitos ajustes a partir das sugestões apresentadas à minuta. Não há previsão de votação em plenário.

A defesa do programa de saúde mental foi alvo, no ano passado, de uma campanha conjunta entre entidades estaduais e do Ministério Público da União, que abarca o organismo em nível federal. Na terça-feira (28) haverá nova mobilização na tentativa de agilizar os trâmites.

OUTRO LADO

Em nota à reportagem, a assessoria de comunicação do CNMP lembrou que a pesquisa foi realizada por iniciativa própria e disse que será analisada em todos os seus aspectos para embasar a construção de uma política unificada de saúde mental.

O Conselho afirmou que pretende, a partir dos resultados da pesquisa, propor uma política unificada de saúde mental, considerando que cada unidade ou ramo do Ministério Público desenvolve políticas próprias nessa área.

Dentro do movimento de instalação dessa política, o CNMP destacou algumas iniciativas. Reforçou que, ainda em 2021, publicou o “Relatório de Riscos Psicossociais no Ministério Público Brasileiro”, com as principais informações sobre o levantamento, e também promoveu o programa “Diálogos Interinstitucionais em Saúde”, para debater os resultados da pesquisa.

Em março de 2023, o Conselho realizou evento sobre os desafios pós-pandemia de Covid-19 para a saúde mental, com palestra do psiquiatra Augusto Cury.

DEPOIMENTOS TRANSCRITOS NA PESQUISA

“Como era um assediador que assediava todas no ambiente de trabalho, ficava incomodada pensando em quando seria minha vez novamente.”

“Fiquei muito preocupada com a chance de cair numa lotação mais difícil, principalmente com as notícias de assédio sexual. Me submeti a uma carga maior de trabalho com medo de parar num local com assédio sexual.”

“Da última vez que meu chefe passou a gritar comigo em frente aos estagiários, eu não tinha coragem nem de olhar meus filhos nos olhos…”

“Me cria revolta quando amigos e colegas são injustiçados, mas nossa instituição não nos permite muita liberdade e respaldo para questionar.”

“Apenas aumentou a minha vergonha de trabalhar na instituição que se diz defensora da sociedade, mas que submete terceirizados e comissionados constantemente a situações de abuso e desrespeito aos direitos.”

“Fiquei bem abalado, pois aconteceu comigo, isso afetou minha vida privada e familiar, algumas vezes chorava e ficava muito triste, a ponto de amigos e familiares, na época do ocorrido, sempre perguntarem se estava tudo bem comigo, quando chegava no trabalho já ficara imaginando o que iria acontecer. Apesar de sempre receber ameaças, graças a Deus essas pessoas saíram do meu setor, pois além de me causar sofrimento, deixavam o ambiente de trabalho pesado.”
Fonte: Folha de São Paulo
 
 


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